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Resenha do livro “Eu sou Malala”

“Papai argumentava que a única coisa que sempre quis foi criar uma escola para ensinar as crianças. Não nos restava alternativa, a não ser o envolvimento em política e em campanhas pela educação”

Por Letícia de Lucena Vaz

Livro Malala

Legenda: Capa do livro. Fonte: Editora Companhia das Letras.

O livro “Eu sou Malala” é a autobiografia de Malala Yousafzai, escrita em parceira com a jornalista britânica Christina Lamb. A narrativa se caracteriza por mesclar as experiências pessoais de Malala e de sua família com acontecimentos históricos, desde a formação do povo patchun (etnia presente no Paquistão e no Afeganistão), passando pela independência da Índia (dos britânicos), pela divisão do território indiano em Índia e Paquistão em 1948 e chegando até a década de 2000 com a ascensão da presença Talibã no país.

Nascida no Paquistão, Malala ficou conhecida mundialmente em 09 de outubro de 2012, dia em que foi atingida por membros do grupo terrorista Talibã quando voltava para casa após uma manhã de provas na escola. Em 2014, com 17 anos, a ativista se tornou a pessoa mais jovem a ser laureada com o Prêmio Nobel da Paz.

Seu ativismo, entretanto, começou muito antes. A menina relata sempre ter tido interesse pela educação, o que em parte se deve à influência do pai, Ziaudin Yousafzai. Professor e dono da escola Kushal, a qual foi diversas vezes acusada de imoralidades e ameaçada pela contínua oferta da educação a garotas, Ziaudin é descrito pela filha como “diferente da maior parte dos homens patchuns”. Ela justifica sua afirmação por atitudes do pai, como a comemoração do nascimento da garota com celebrações reservadas a filhos do sexo masculino.

Em 2009, quatro anos após a presença do Talibã no Vale do Swat (norte do Paquistão) ter sido iniciada, o grupo estabeleceu o dia 14 de janeiro como data limite para as garotas deixarem de ir à escola. Nesse dia, as ações de Malala foram acompanhadas por um grupo de cinegrafistas, dando origem ao documentário “Class Dismissed” do New York Times. No mesmo ano, a aluna relatou a vida sob o Talibã usando o pseudônimo de Gul Makai para o serviço em urdu da BBC.

 

“Nenhum patchum deixa sua terra por vontade própria. Ou ele a deixa por pobreza ou por amor”- Tapa (gênero de poesia popular patchum)

“Mas estávamos sendo expulsos por um terceiro motivo, que o autor do tapa nem podia imaginar: o Talibã”

 

Quatro meses depois, o contínuo avanço do Talibã levou o exército paquistanês a adentrar o Vale do Swat e recomendar que todos deixassem suas casas. Nesse ano, o número de pessoas deslocadas internamente no Paquistão chegou a quase 2 milhões, segundo dados do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur). Malala e sua família estavam entre eles, tendo sua primeira experiência de deslocamento forçado.

Em três meses, o grupo passou por quatro cidades, ficando na casa de parentes, enquanto grande parte dos outros habitantes do Vale do Swat foram alocados em campos de refugiados. Em julho, foi declarado que o Exército havia tido sucesso em sua operação e que seria seguro voltar para o Vale. Ao retornar para casa, Malala relata seu alívio nas seguintes palavras:

 

“Para minha alegria, encontrei a mochila da escola com meus livros, e dei graças por minhas preces serem atendidas: estavam todos a salvo”.

 

Um ano depois, em julho de 2010, o país foi atingido por fortes chuvas e enchentes, sendo cerca de 950 mil pessoas levadas à condição de deslocadas internamente, segundo o Acnur. A narrativa relata o medo da população paquistanesa de que a precariedade da situação levasse a uma nova ascensão do Talibã, como ocorreu durante o terremoto de 2005, momento no qual associações militantes se destacaram na ajuda humanitária.

O desastre era visto como um aviso de Deus para que a Sharia fosse seguida. Tal ideia foi amplamente difundida pela Mulá FM, emissora de rádio com interpretações extremistas que se expandiu pelo vale em 2005, momento em que a presença Talibã teve início.

Já em 2010, as autoras apontam o fato de o Talibã ter proibido a ação de entidades de assistências cristãs e judias no auxílio após as enchentes. Tal fato, somado com a continuidade de ataques a escolas levantaram a dúvida sobre a realidade do fim da presença talibã.

Em 2012, militantes do grupo invadiram o ônibus escolar em que a aluna se encontrava e dispararam três tiros, dois deles atingindo duas colegas e um deles passando pelo seu olho e saindo pelo ombro. Depois de passar por diferentes hospitais no Paquistão, ela foi transferida para o Reino Unido, onde, juntamente com seus pais e irmãos, mora como refugiada desde então.

Uma reportagem da BBC mostra que a família voltou ao Paquistão apenas uma vez em 2018, para uma visita breve, com forte esquema de segurança e noticiada apenas depois de sua ocorrência. Malala continuou sua educação no Reino Unido, onde se formou na Universidade de Oxford em junho de 2020. Ela continua defendendo esse direito básico, especialmente para garotas, através da Malala Fund, fundação com ações no Afeganistão, Brasil, Etiópia, Índia, Líbano, Nigéria, Paquistão e Turquia.

 

 

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